terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Janelas Abertas nº 2

para Experimento Audiovisual de Inércia, Tédio e Silêncio

Ainda ontem, ao sair de casa, pela manhã, para comprar o jornal - que eu, fatalmente, não leria, pois mesmo não leio nenhum dos que compro -, cruzei este corredor vazio, como sempre o é. É incrível como durante todo este tempo em que tenho vivido aqui eu nunca sequer vi um vulto de gente, de bicho... De nada. Talvez tenha alguém preso lá dentro, do outro apartamento. Alguém que não consiga cruzar a soleira, que esteja, quem sabe(?), colado à madeira da porta, espiando, através do olho mágico, o corredor vazio que se acende e apaga o tempo todo. Não duvido, sinceramente, que ele, amiúde, abra e feche a tranca, que mal respire, que olhe a janela que lhe faz arrelias por estar sempre tão escancarada, não duvido de nada que venha de um cara preso mais dentro de si do que do apartamento.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Menina.

Colorida, tropeçava nas ladeiras da cidade. Caminhava por entre vielas, avenidas, ruas, ruínas, esquinas, meninos, meninas. Tinha a beleza de uma ninfa e a pureza de um delírio. Lasciva, com seus seios, poses e pernas. Dançava - quase sempre a mesma música -, alternava passos, olhava, pensava, ardia, corria. Sempre corria. Desentendia também. Tanta beleza imprevista, tanta beleza nunca antes vista. Era fogueira irreprimível de fogo velado e vadio. Diziam-na fuleira alguns, mal sabiam... Queimava-se só consigo, aprendera assim e assim era. Ainda desentendia. Pintava os cabelos, os olhos e a boca. Colorida, caminhava nas ladeiras de seu corpo, tropeçava por entre as vielas, avenidas, ruas, ruínas, esquinas, meninos... Menina.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Para consumir: Civone



A virada num traque Civone Medeiros lança e relança, respectivamente, seus livros "Escrituras Sangradas #2: Ave de Arribaçã ou A Propósito de Viena e Outros Ondes" e "Escrituras Sangradas #1: Toscas Fatias de Escrevinhadura" no Café Salão Nalva Melo no dia 29/10 (quinta-feira) às 18hrs. A multiartista vai contar com a presença de uma penca de gente-boa "fazendo arte" por lá, dentre eles Múcia Teixeira, Mambembe, Luís Gadelha, etc. Na (des)programação vai rolar performance, música, recital poético e muita - mas muita mesmo - liberdade artística. Fica a dica!

domingo, 11 de outubro de 2009

Eu preciso.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Socioanatomia: apresentação

Uma moça nua e uma câmera de vídeo.

socioanatomia

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Alice para Clarice

(...) vão
com a fantasia seguindo a trilha
dessa menina feita de sonho
que em seu país só de maravilhas
fala com bichos e passarinhos
- e o olhar delas crédulo brilha

Cap. 1, §2
Ela perguntava a si mesma se o prazer de fazer uma guirlanda de margaridas valia o esforço de ir colher as margaridas.

Cap. 1, §3
Alice não achou verdadeiramente notável nem mesmo quando o Coelho Branco disse para si mesmo: - Meu Deus! Meu Deus! Vou chegar atrasado! - Mas quando ele tirou um relógio do bolso do bolso do colete, olhou as horas e depois continuou seu caminho a toda pressa, Alice levantou-se. Teve a impressão de que nunca em sua vida tinha visto um coelho que tivesse um colete com bolso e muito menos um relógio para tirar do bolso.

Cap. 1, §5
(...), sem se perguntar nem por um momento como faria depois para voltar.

Cap.1, §15
Alice não tinha a menor idéia do que fosse uma latitude ou uma longitude. Mas achava muito elegante pronunciar essas palavras tão difíceis.

Cap.1, §27
(...) Alice estava começando a acreditar que bem poucas coisas eram verdadeiramente impossíveis.

Cap.1, §29
Era muito simples dizer: beba-me. Mas Alice era muito inteligente para fazer isso sem refletir.
- Não, vou primeiro ver se está escrito veneno em algum lugar.

Cap. 1, §37
(...) Alice estava ficando tão habituada a só esperar coisas extraordinárias que agora achava absolutamente estúpido ver a vida acontecer de uma maneira comum.

Cap. 5, §2
- (...). Eu sei quem eu era quando me levantei esta manhã, mas passei por uma porção de transformações depois disso.

Cap. 5, §15
(...) logo se habituou e recomeçou a falar sozinha, como sempre.

Cap. 6, §34
- (...). Vá visitar qualquer um deles, tanto faz. São ambos loucos.
- Mas não tenho a menor vontade de ir à casa de gente louca!
- Onde você iria, então? Todos somos loucos aqui. Eu sou louco. Você é louca.
- Como sabe que sou louca?
- Tem de ser, senão não estaria aqui.
Alice não achou que isso fosse uma prova. Em todo caso, continuou:
- E como sabe que você próprio é louco?
- Eu explico - disse o Gato. - Você concorda que os cães não são loucos, não é?
- Concordo.
- Pois bem, você sabe que um cão rosna quando está zangado e abana o rabo quando está contente. Ora, eu rosno quando estou contente e abano o rabo quando estou zangado. Portanto, sou louco.
- Eu chamo isso de ronronar e não rosnar - disse Alice.
- Chame como quiser. Vai jogar croqué com a Rainha hoje?
- Bem que gostaria. Mas ainda não fui convidada.
- Você me encontrará por lá - disse o Gato. E desapareceu.
Alice não ficou muito espantada. Estava ficando habituada com acontecimentos extraordinários.

sábado, 29 de agosto de 2009

A Possibilidade de Fazer Sombra


Direção: Maurício Motta

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Ninguém me vê

Aprendi, em meus tão poucos anos, a não me preservar. Não tenho bons motivos para viver longamente, ou para esconder-me da morte como se a morte não fosse uma coisa natural da vida. Não, eu não tenho bons motivos para viver pela metade.
Nos meus tão poucos anos de vida, aprendi a abrir o pano, a entrar inteiro no palco e sair aos pedaços. Nos meus tantos anos de sonho, sangue e América do Sul, ensaiei todos os passos da minha obra de improviso. E não me peça para falar dos atos em que me suicido para conseguir sobreviver!
Para todos os efeitos, estou inteiro. Para dizer a verdade, sou só pedaços. Estou espalhado pela cidade: na boca das meninas, no corpo dos meninos, nos quartos, nas salas, cozinhas... Estou impregnado no ar puro e na fumaça; desço quente, rasgando, feito gole de cachaça; sou a mentira absurda que te contam na TV: eu estou em todos os lugares, mas ninguém me vê.